O mercado de games independentes (ou simplesmente indies, para os íntimos) cresceu absurdamente nos últimos anos, o que é fácil de se observar pela quantidade de títulos disponíveis em grandes redes digitais como a Xbox Live, PlayStation Network e Steam.

Os jogos independentes são uma maneira das pessoas que os produzem, mostrarem suas ideias e focar na diversão do jogador. Não contam com grandes orçamentos (geralmente começam do nada) e amigos e colegas ajudam na produção, com poucos recursos, mas com muita força de vontade, resultando em títulos casuais e simples, mas com grande fator de diversão.

No Brasil há várias pessoas e pequenas empresas que se aventuram nesse mercado, algumas alcançando algum reconhecimento (como a WaterMelon do jogo Pier Solar), outras não.

Afinal, esse é um campo extremamente concorrido, que necessita de um grande esforço e empenho dos profissionais envolvidos, como é o caso do mineiro Cleber Casali, estudante de computação da UFJF e que tem como hobby desenvolver jogos nos últimos 20 anos.

Fascinado por videogames desde criança, Cleber teve suas primeiras experiências em programação com o saudoso sistema MSX, onde criou alguns joguinhos simples. Os anos passaram e ele chegou na era do Master, e em seguida o Mega Drive, o seu console favorito até hoje.

Cleber já desenvolveu alguns jogos para PC, que você pode conferir em seu blog, e recentemente começou a desenvolver para o Mega Drive também. Após fazer um port do clássico “Adventure” do Atari para o Mega, ele começou um novo projeto chamado “YAGAC MD” – um título original que já havia feito no PC.

O jogo foi completamente desenvolvido por mim, desde a engine até os gráficos, sons e músicas. Ou seja, um título 100% brasileiro e sem problemas com licenças“, contou para nós.

Fiz um port do meu jogo YAGAC para o Mega e implementei diversas melhorias como gráficos diferenciados para cada fase, novos inimigos, etc. O jogo acabou ficando melhor que eu esperava. Espero que fique pronto no começo de 2017“.

Confira abaixo uma pequena entrevista que fizemos com o Cleber:yagac-md-08302700

Olá Cleber, faça sua apresentação para os nossos leitores e nos conte sua experiência/relação com videogames.

Saudações pessoal, meu nome é Cleber. Sou natural de Juiz de Fora – MG, aluno de computação da UFJF, mas passei a maior parte da minha vida em Viçosa – MG. Durante o dia, sou servidor da Universidade Federal de Viçosa, sendo o responsável pela seção de Acervo Digital da instituição. Mas no meu tempo livre, o que gosto mesmo de fazer é desenvolver games.

Desde o dia em que ganhei um Atari 2600 de presente, me tornei fascinado por vídeo games. Com o MSX tive minhas primeiras experiências com programação, devorando manuais e criando alguns joguinhos simples em BASIC, o que rapidamente se tornou meu principal hobby.

Tive um Master System, e em seguida um Mega Drive. Meu Mega Drive funciona até hoje e continua sendo meu favorito.

Já no PC, comecei a criar pequenos jogos em BASIC. Programei em QBASIC, QB45, QBX… Com cerca de 17 anos de idade, com a ajuda de um amigo e um músico que conheci na internet, iniciei o que considero meu primeiro jogo completo, um RPG chamado DarkPhear.

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Dark Phear

Também passei pelo DarkBASIC e finalmente pelo FreeBASIC, que uso até hoje. Apesar da simpatia por BASIC, hoje também programo em C e diversas outras linguagens.

Com o passar dos anos desenvolvi diversos jogos para o PC: um fangame de River Raid, um fangame de Double Dragon, YAGAC, Odysseasons, Numbezzled… Sem contar inúmeros projetos inacabados.

Atualmente estou desenvolvendo jogos com o BasiEgaXorz, um compilador BASIC capaz de criar jogos para o Mega Drive, Sega CD e 32X. Cheguei a fazer um port/conversão do jogo “Adventure” do Atari 2600 para o Mega Drive.

No momento estou trabalhando em uma versão aprimorada do meu jogo original YAGAC para o Mega Drive, entitulado YAGAC MD. Espero poder lançar na primeira metade de 2017.

Alguns dos meus games podem ser conferidos em meu blog.

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YAGAC para PC

Como surgiu a ideia de “YAGAC”?

O YAGAC surgiu inicialmente para PC. Uma das minhas linguagens de programação favoritas é o FreeBASIC. Trata-se de um compilador BASIC multiplataforma com recursos modernos, como suporte a OpenGL, orientação a objetos, etc.

De tempos em tempos, acontece uma competição de desenvolvimento de jogos em FreeBASIC, na qual já sou tricampeão 😉

As competições sempre têm um tema, e naquela ocasião, entre 2011 e 2012, o tema escolhido foi “rescue the colors”, ou “resgate as cores”. Gostei muito da ideia e o YAGAC surgiu naturalmente deste conceito. O nome YAGAC significa simplesmente “Yet Another Game About Colors”, ou “mais um jogo sobre cores”, sendo que surgiriam vários jogos sobre cores.

Quando comecei a ter contato com o BasiEgaXorz, tive a ideia de fazer o port do YAGAC para o Mega Drive. Obviamente não era possível fazer com os efeitos 3D. Não foi algo simples e direto, tive que reescrever a maior parte do código, e a mecânica não ficou idêntica. Mas na minha opinião a versão do Mega Drive superou a antiga, além de ter novos gráficos, novas fases, etc.

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YAGAC MD

Fale um pouco sobre o game, sua história, mecânicas, influências e no que se destaca entre os demais jogos do gênero.

YAGAC MD é um jogo original que combina plataforma, ação e puzzle. Fiz tudo sozinho: programação, gráficos, música.

O jogador deve explorar labirintos procurando pelas esferas coloridas. Cada esfera recolhida libera uma cor. Quando a cor é liberada, os blocos daquela cor se tornam sólidos, permitindo acessar outras partes do labirinto. Os cenários também vão ficando cada vez mais coloridos, bonitos e animados, na medida em que as cores são liberadas. A fase é concluída quando o jogador encontra a porta de saída do labirinto. Mas é preciso também encontrar uma chave para abri-la.

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YAGAC MD

Me inspirei em diversos games clássicos. A ideia dos blocos que se tornam sólidos veio dos blocos de exclamação de Super Mario World. Mas eu queria uma mecânica mais veloz como a de Sonic, e labirintos enormes como em Pitfall 2. Esta combinação acabou resultando em uma jogabilidade bem original e desafiadora.

Para os gráficos eu me inspirei em alguns jogos antigos do MSX, que conseguiam ter um visual atrativo e enigmático, mesmo sendo praticamente monocromáticos. Posso citar Nightshade e Head Over Heels.

Um fato curioso: durante o desenvolvimento, quando eu ainda não tinha finalizado as animações do personagem, por pura diversão coloquei o personagem para girar durante o pulo, como uma referência ao Sonic. “Bonequinho suicida”, me disseram. Achei o resultado hilário e resolvi deixar assim.

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Double Dragon Forever

Qual é a maior dificuldade no desenvolvimento de um jogo indie?

A maior dificuldade que vejo é rentabilizar o jogo. O jogo precisa pelo menos se pagar, para valer o tempo, o esforço e a dedicação dos envolvidos. Caso contrário, cessa a motivação pra desenvolver.

Os games que estão nas prateleiras de lojas hoje em dia são superproduções, assim como ocorre no cinema. Com equipes gigantescas, que além dos programadores, contam com modeladores, técnicos, atores para captura de movimentos, dubladores, músicos… Simplesmente não dá para competir neste mercado. É como querer filmar o próximo Star Wars no quintal da sua casa com seus amigos, usando a câmera do seu celular.

O que resta para os desenvolvedores indie são jogos mais simples, mas com jogabilidade inovadora, ou com estilo retrô que remeta aos anos 80 e 90. É uma arte que requer dedicação, inspiração e originalidade.

Porém é difícil conseguir se levantar algum dinheiro com um jogo assim, quando existe uma infinidade de jogos gratuitos na internet. Sem contar a pirataria.

Venho desenvolvendo jogos há anos e o único retorno que tive foram prêmios que ganhei em concursos, uns trocados com Google Adsense e algumas poucas doações.

Não é fácil convencer a Valve a colocar um jogo indie no Steam, por exemplo. É preciso que ele se destaque dos demais, e é preciso uma campanha de marketing agressiva, pois você precisa ter uma base de fãs antes mesmo do jogo estar pronto. Precisa ser um sucesso antes mesmo de existir.

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Retro River Raid

O que você acha da indústria de games no Brasil?

Confesso que não conheço muitos jogos brasileiros. Tenho mais afinidade com jogos antigos, até a 4ª geração.

Acho notável o que a Tectoy conseguiu realizar no Brasil nos anos 90. Não só publicou, como também traduziu e adaptou games, e lançou até mesmo alguns títulos exclusivos, numa época em que isso era muito mais difícil sob o ponto de vista técnico.

O Brasil, infelizmente, não tem esta tradição na arte de criar games. Os games por aqui são vistos com muito preconceito, e nem sequer são considerados obras de arte. Além disso, a burocracia e os impostos são proibitivos. Restam alguns títulos indie e alguns pequenos e corajosos estúdios. Existe um nicho, mas assim como acontece no cinema, fica quase impossível competir diretamente com as grandes empresas internacionais.

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Aventura (para Mega Drive)

Para finalizar, quais são os seus planos para o futuro, mais algum projeto em mente?

Espero continuar criando meus jogos. É minha arte, minha paixão, e o que realmente gosto de fazer.

Tenho várias ideias de jogos, alguns viáveis para o Mega Drive. A vantagem é que vou poder aproveitar muito da engine de YAGAC MD, e o desenvolvimento será bem mais rápido.

Já tenho um planejado pra depois do YAGAC MD. Mas só vou revelar quando tiver a demo pronta.

Também estou trabalhando secretamente em um novo jogo para PC, mas que vem se arrastando por anos. Espero poder concluir em breve.