Como prometido, estamos de volta com a segunda parte do “Dossiê Tectoy“, onde vocês conferem algumas curiosidades e bastidores do desenvolvimento do novo Mega Drive – para conferir a parte um com o Olimpio, Gerente de Projetos da Tectoy, clique aqui.

Desta vez trazemos um bate-papo com o Heriberto Martinez, gerente de engenharia da Tectoy – quem acompanha o nosso blog já conferiu outra entrevista com ele no ano passado.

Heriberto despertou o interesse pela área de eletrônica aos 12 anos de idade, quando ganhou de seu pai um kit de experiências e começou a montar circuitos apresentados nas revistas especializadas. “Nessa época poucos deles funcionavam e a maioria explodia…“, contou para nós.

Aos 16 anos já cursava a escola técnica, época em que comprou pelo correio um kit para montagem de um videogame. “Esse funcionou. Era tipo Telejogo [lançado em 1977 no Brasil], com Paredão, Tênis e Futebol, usando aquelas barras verticais. Curioso que essa montagem do meu primeiro game foi feita quase 10 anos antes da Tectoy ser fundada“.

Heriberto começou a trabalhar na Tectoy em 1991 como engenheiro de hardware. Eventualmente acabou assumindo a coordenação dos departamentos de Hardware e Software onde teve a oportunidade de participar de vários trabalhos interessantes. “Hoje em dia, a maioria dos projetos funciona, e alguns poucos explodem. Mas as explosões são bem maiores…“.

na imagem Heriberto (à esquerda) com Olimpio testando o Mega Drive

Entrevista – Heriberto/Olimpio

Como foi idealizar o desenho da nova placa-mãe do Mega Drive? Por que a escolha da memória Nand da Macronix e da memória Ram da Etrontech?

Heriberto – O layout de uma placa de circuito impresso acaba sempre sendo função da menor área para acomodar o circuito eletrônico proposto e se adequar à mecânica do gabinete. Hoje com uma maior densidade de integração do circuitos, quando comparamos com a época do Mega original, podemos notar que temos espaço interno sobrando. Por isso o projeto foi dividido em 3 placas conectadas entre si por cabos. Se não fizéssemos dessa forma o custo do produto seria um pouco maior. Para aqueles que já se preocupam com antecedência, podemos dizer que estamos confiantes na segurança dos conectores e não teremos problemas de “mau contato“.  

Como se tratava de um layout mais complexo, decidimos terceirizar esse serviço com uma empresa nacional que já nos atende há vários anos. É a RSCAD .

Para que a RSCAD possa fazer o traçado da placa, entregamos para eles o esquema elétrico o mais próximo possível daquilo que esperamos ser o funcional, desenhos dos componentes, contorno da placa e furação.  

Eles então nos apresentam uma proposta de “placement”, ou seja, posicionamento dos componentes, verificamos se não existe nenhuma situação crítica, como por exemplo, cristal muito afastado do chip principal e autorizamos que eles iniciem o roteamento.

A seguir eles nos apresentam o roteamento pronto, se tudo parecer OK disparamos uma produção limitada de placas protótipos. Esse ciclo se repete até que tenhamos chegado a uma placa que consideramos pronta para produção em massa.

Essas placas protótipo como são uma produção de baixa quantidade, são produzidas em empresas dedicadas à baixo volume. Nosso fornecedor normal também é uma empresa nacional, a Micropress.

Essas placas recebemos não montadas, então a montagem dos protótipos é feita manualmente. Os componentes do Mega Drive, embora sendo SMD, não são tão reduzidos, então com um pouco de paciência e cuidado é possível fazer a montagem manual.

Quanto a memória da Macronix, para ser mais exato, ela é uma Flash NOR. A configuração de uma memória NOR é a mesma utilizada pelas ROMs do cartucho, como o firmware desse projeto roda em código do 68000, pareceu mais natural escolher essa configuração. É como se a memória Flash embarcada fosse um cartucho, ele apenas não executa um jogo mas sim a inicialização do sistema.

Porque Flash e não uma ROM ou PROM?  Pelo volume de produção planejado que não seria alto, a Flash chegou na melhor relação custo-benefício.

Porque as marcas Macronix e Etrontech? Por serem marcas que já utilizamos em outros modelos de Mega Drive e também DVDs Player. Nunca tivemos nenhum problema de qualidade e elas estavam sendo oferecidas a um bom custo. Claro que existem outras marcas também viáveis de serem utilizadas, mas tudo depende do momento do mercado de memórias, que por sinal é bem volátil.

Qual é o SoC (System on Chip) utilizado pela Tectoy para conter a solução de processamento do MC 68000, o Zilog Z-80, o Yahama 2612 e o VDP (YM 7101 + PSG) do Mega Drive?

Heriberto – É o RK2500 da DMC. É um chip já há algum tempo no mercado. Foi escolhido em função do custo, mas principalmente pela disponibilidade do componente. Uma vez  que o tempo que tínhamos para a data comemorativa do aniversário da Tectoy era apertado.

Desenvolver um novo chip estava fora de questão, não teríamos volume de vendas para amortizar um investimento de centenas de milhares  de dólares, o prazo também seria uma incógnita porque não temos experiência em desenvolvimento do chips.

A outra opção que também foi descartada era de utilizar uma CPU de maior processamento e rodar um emulador. Mas, além da rejeição que o mercado mostra aos emuladores, ainda seria preciso gastar um tempo escrevendo/portando um emulador.

Por que da escolha de não dar suporte de compatibilidade com o 32X, o Sega CD, o Power Base Converter e demais acessórios do Mega Drive original?

Heriberto – Essa restrição é consequência da escolha do chip. Como o chip não projeta para fora todos os sinais de controle do 68000, que em sua maioria estão presentes no slot do cartucho e no slot lateral, acessórios que dependem desses sinais não tem como funcionar. Para o Power Base o problema é mais interno, o SoC não implementa a sub-configuração Master System do produto original.

Olimpio – Na verdade, testamos vários acessórios e a maioria não funcionou. Entretanto, ao contrario do que a comunidade esperava, o jogo Sonic & Knuckles com Lock-on funcionou com Sonic 1 e Sonic 2.

Quais foram as maiores dificuldades para programar o menu inicial do novo Mega Drive? Qual linguagem vocês utilizaram? Existe a possibilidade de deixar o menu sem músicas ou de ter outras no mesmo?

Heriberto – A maior dificuldade foi o funcional do cartão SD. A principal linguagem utilizada foi C. Um pouco de assembly também.

Na versão atual do firmware não foi previsto um botão de mute e temos apenas uma música. Não colocamos a música como prioridade porque obviamente o funcional do cartão e outros detalhes de hardware tinham mais problemas a serem resolvidos.

Mas o que teria sido muito simples de implementar e que passou como esquecimento, foi um controle para fazer o Mute. Talvez se houver uma atualização do firmware possamos adicionar essa função.

Olimpio – Eu cheguei a digitar uma ou duas linhas de código no Menu. Na minha opinião, o que deixa o processo complicado é o pipeline para gerar binário. Alguns testes até podem ser feitos num emulador de PC, mas o processo de compilar o Menu e testar no videogame é mais demorado, pois precisamos atualizar os arquivos que vão no cartão SD.

E quanto ao slot de cartucho desta nova placa-mãe, houve alguma dificuldade?

Heriberto –  Dentro das restrições comentadas anteriormente, não houve nenhum grande problema em colocar o slot em funcionamento, o chip foi projetado prevendo o uso do cartucho. Infelizmente ele não oferece compatibilidade total.

Em breve a Parte 3, aguardem.