Como já vimos em nosso post sobre capas icônicas do Atari 2600, a imaginação e criatividade eram dois fatores essenciais para os jogadores do aparelho, devido às limitações visuais e sonoras que se limitavam a visuais e sons simples.

E se teve um jogo que explorou bastante esses aspectos foi o título “Adventure” (Aventura), lançado no final de 1979 e que se tornaria não só um dos maiores clássicos do sistema, como também da história dos videogames no geral, introduzindo elementos que seriam extremamente populares em games de aventura/exploração como as séries Phantasy StarTurma da Mônica, entre outros.

Concebido por Warren Robinett, foi inspirado no jogo de texto “Colossal Cave Adventure”, criado em 1976 por Will Crowther e modificado posteriormente por Don Woods.

Warren Robinett, o criador de Adventure

Este jogo era 100% texto, sem gráficos, mas tinha a ideia de salas e obstáculos, objetos que você poderia pegar para superar as criaturas que se moviam de sala para sala. Todos os elementos de Adventure, mas sem gráficos e sem som“, revelou Robinett na feira Game Developers Conference 2015 (via Gamasutra), sobre as referências de seu game.

Robinett ficou encantado com “Colossal Cave Adventure” e resolveu transportá-lo como um jogo eletrônico para o Atari 2600, uma ideia que não agradou muito aos seus chefes na época, que não gostaram dos conceitos inovadores do game –  que era muito complexo e os executivos queriam apenas jogos que se repetissem na busca de pontuações maiores.

Então, o que eu fiz foi simplesmente ignorar meu chefe e trabalhei em segredo para desenvolver um protótipo de Adventure“. Uma vez que ele conseguiu demonstrar aos chefes que sua ideia era viável, ganhou sinal verde para trabalhar no projeto, apesar da pressão da chefia de reconfigurar o game como sendo do Superman, por causa do filme que estava saindo nos cinemas (na época a Warner, dona dos direitos cinematográficos do herói, havia comprado a Atari – saiba mais detalhes disso em nosso post especial sobre Nolan Bushnell).

abra o portão do Golden Palace com a chave certa

O que hoje levaria apenas algumas horas para um programador tarimbado criar, levou para Robinett aproximadamente um ano para projetar e codificar o jogo, período o qual teve que ser criativo para superar uma variedade de limitações técnicas no hardware do console.

Experimentei usar uma tela de inventário, mas se um dragão viesse e te devorasse enquanto estava olhando para o seu inventário, bom … isso não estava certo“, comentou. Ele considerou uma maneira de pausar o game para mexer no inventário, mais ao invés disso “Gostei da ideia de permanecer em tempo real, então eu desenvolvi que fosse possível carregar apenas um objeto por vez“.

Um dos elementos principais do game, o irritante morcego que move os objetos aleatoriamente pelos cenários do jogo, foi uma adição de última hora.

o morcego-ladrão foi introduzido no jogo na última hora

Qualquer um que jogou Adventure se lembra do morcego“, disse Robinett, observando que ele foi adicionado no final da produção, para manter o jogo interessante. “A maneira de você deixar um puzzle mais interessante é adicionar aleatoriedade“. Ao ter o morcego movendo objetos ao redor (e até mesmo roubando objetos do jogador), Robinett acredita que o tornou bem mais interessante e duradouro.

O jogo, considerado um dos primeiros títulos de aventura e fantasia, possui uma história digna dos melhores contos heroicos, perfeita para despertar a imaginação dos jogadores: ela conta que um feiticeiro maligno roubou o Cálice Encantado e que o escondeu em algum lugar no reino.

O jogador controla um aventureiro (representado como um quadradinho na tela), que deve explorar esse labirinto à procura do Cálice e devolvê-lo ao Golden Castle, local onde deve ficar. Mas a tarefa não será fácil, já que o feiticeiro criou três dragões para acabar com os destemidos heróis.

Há o Dragão Amarelo chamado Yorgie, que anda livremente pelo cenário (e eventualmente ajuda os outros dragões); Grundle, o Dragão Verde, que guarda os itens ímã, ponte, a chave negra e o Cálice; e por fim Rhindle, o Dragão Vermelho, o mais rápido e mais agressivo de todos. Ele guarda a chave branca e o Cálice. Todos os dragões podem devorar o jogador e colocar um fim em sua aventura. Além deles há o já citado morcego, que rouba e esconde importantes itens no labirinto do jogo – ele inclusive pode carregar um dragão e deixá-lo bem na sua frente, o que não não será nada agradável.

o morcego-ladrão e os dragões “patos” – o amarelo está morto na imagem

Entre os itens espalhados há três chaves da cor Branca, Amarela e Preta, sendo que cada uma abre um castelo da respectiva cor; uma ponte que possibilita a passagem por paredes; uma espada (representada por um símbolo que mais parece uma flecha) que mata os dragões e por fim um imã, que atrai todos os objetos anteriores para perto do jogador (caso estejam em um lugar inacessível).

Uma característica bem interessante para a época era uma espécie de continue rudimentar: caso o jogador fosse morto, o item que carregava continua no mesmo local de sua morte, o que facilitava ao iniciar uma nova partida, não tendo que repetir tudo novamente – porém os dragões mortos também eram ressuscitados.

o almejado Cálice

O jogo possui 3 níveis de dificuldade:

  • Nível 1 (mais fácil)
  • Nível 2: O Reino é maior que o Nível 1, contendo salas secretas e itens ocultos para adicionar dificuldade.
  • Nível 3 (mais difícil): semelhante ao nível 2, mas todos os objetos/itens são colocados aleatoriamente em todo o Reino.

Uma Aventura inesquecível!

O jogo do “quadradinho” quebrou várias barreiras ao explorar a imaginação dos jogadores como nenhum outro game havia feito até então: de os colocar em uma aventura épica desbravando labirintos, procurando castelos encantados e enfrentando perigosos dragões pelo caminho! Rapidamente o título se tornou um sucesso esmagador e vendeu mais de um milhão de cópias. Um clássico que serviu de inspiração para outros jogos (como a série Swordquest) e que pode ser apreciado em toda a sua glória em nosso Atari Flashback 7.

Curiosidade: Adventure foi o primeiro jogo eletrônico a conter um Easter Egg (informações escondidas), que nasceu da contestação do desenvolvedor pela política da Atari de nunca divulgar os nomes de seus programadores, de modo que todos os créditos ficassem com a empresa. Assim, no jogo há uma sala oculta onde se pode ler: “Created by Warren Robinett” (Criado por Warren Robinett) – uma “malandragem” que vários outros programadores usaram em seus jogos, como é o caso de “Yar’s Revenge“.

“Era uma assinatura, como a de um artista em uma pintura. Mas para que isso fosse possível, eu tive que esconder a minha assinatura no código do jogo, em um lugar muito obscuro, e não contar a ninguém. Manter o segredo não foi fácil! Eu estava muito tentado a contar aos meus dois melhores amigos na Atari, Tom e Jim Huether, mas não contei nem para eles. Então eu entreguei a versão final de Adventure, e a Atari fabricou e distribuiu milhares de cartuchos do jogo. Quando eles descobriram, já era tarde demais”, revelou em entrevistas. Abaixo você confere um vídeo do easter egg: