A série Shinobi certamente foi uma das mais marcantes que passaram pelos sistemas da Sega, em especial o Master System e o Mega Drive, apresentando as aventuras do ninja Joe Musashi, em um universo que misturava o misticismo oriental com o mundo moderno.

Apesar de esquecido pela Sega atualmente, o personagem ainda possui uma legião de fãs fieis que lembram dos seus três principais games na geração 16 Bits: The Revenge of Shinobi, Shadow Dancer e Shinobi III: Return of Ninja Master.

E é justamente do terceiro título (ou como era conhecido no Japão, Super Shinobi II) que vamos falar hoje. O título foi lançado em 1993 para o Mega Drive, após um ano de adiamentos e vários transtornos em sua produção. Apesar do atraso, quando foi lançado fez um enorme sucesso entre os jogadores e a crítica especializada.

Mas, para falar com mais detalhes desse clássico, nada melhor do que o próprio diretor do game, Tomoyuki Ito, que contou sobre sua experiência de trabalho em entrevista publicada no livro “Sega Mega Drive/Genesis: Collected Works”.

Ito começou a sua carreira de designer de games na saudosa Data East, no final dos anos 80, quando em 1992, no meio da produção de The Super Shinobi II, foi chamado pela Sega para assumir o cargo de diretor e colocar o projeto nos eixos, que estava meio perdido.

Entre as novidades para a série, ele trouxe um maior ritmo e fluidez, além de uma atmosfera hollywoodiana em várias partes do jogo. Ito dirigiu alguns games no Saturno, como “Clockwork Knight” e “Dragon Force”, mas hoje em dia é um diretor freelancer que faz jogos para crianças.

Confira abaixo um trecho da entrevista e descubra coisas interessantes, como as influências cyberpunks que o jogo teve no seu visual ou ainda de como a saudosa Treasure (de Gunstar Heroes) ajudou a equipe no desenvolvimento de The Super Shinobi II. Boralá?

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O que te inspirou a entrar na indústria de videogames?

Originalmente eu queria trabalhar em publicidade, mas um amigo da universidade começou a trabalhar para uma empresa de jogos – a Data East Corporation – e eu segui o exemplo. Eu gostava de jogos, e na época, era especialmente enviado para títulos cheios de ação e intriga – eu até comprei um [computador] Amiga apenas para jogar “Dungeon Master” [lançado em 1987]!

Como você se envolveu com a série Shinobi?

O desenvolvimento de “The Super Shinobi II” estava se movendo lentamente, já que havia apenas um membro da equipe trabalhando no projeto, por isso o meu então chefe me pediu para ajudar a trazer o jogo de volta ao caminho certo. Eu não era particularmente um fã da série, mas eu amava mangás e animes sobre ninjas, então foi uma grande honra contribuir para o legado Shinobi.

O que você acha que era o principal apelo da série?

Pode ser que o conceito de um ninja como um super-herói, que é bastante absurda! Eu também acho que como Joe Musashi, o personagem principal, não fala muito, o faz parecer muito legal.

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O que você desejava alcançar com o The Super Shinobi II?

Eu queria fazer um jogo que fosse como um filme ou um anime, no qual o jogador pudesse assumir o controle total do personagem principal. Em outras palavras, eu queria que os jogadores fizessem sua própria experiência. Eu me tornei obcecado em desenvolver formas interessantes e legais para derrotar os inimigos ou para escapar de situações difíceis. Por exemplo – como é a convenção em filmes de ação – eu projetei explosões que perseguiam o personagem principal, por isso ele tinha que correr pela fase toda para escapar delas. A primeira metade do Round 5, “Eletric Demon”, é um bom exemplo disso.

Assim que assumiu o papel de diretor, quantas pessoas na equipe você tinha trabalhando no título?

Nossa equipe de desenvolvimento era composta por 10 membros principais, incluindo artistas sonoros. Além disso, pedimos que outros membros da equipe testassem o jogo e terceirizamos algumas das lutas contra os chefes para uma empresa de desenvolvimento externa. A equipe que criou o The Super Shinobi [The Revenge of Shinobi no ocidente] estava desenvolvendo outro jogo ao mesmo tempo – Streets of Rage 2 – então eles só estavam envolvidos no The Super Shinobi II a título consultivo.

Você pode descrever o ambiente de desenvolvimento de jogos da Sega na era do Mega Drive?

Na época, a Sega usou muitos estúdios de desenvolvimento externos, uma das quais, chamada Megasoft, que contribuiu para o desenvolvimento de The Super Shinobi II. Eles trabalhavam em um escritório independente, e eu me lembro da atmosfera ser extremamente relaxante. A Treasure era localizada no mesmo prédio e eles nos deram muitos conselhos durante o desenvolvimento.

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O que você aprendeu com a Treasure?

Eles gentilmente nos mostraram algumas demos em andamento do jogo que estavam a trabalhar – Gunstar Heroes – e conversaram conosco sobre o seu processo de desenvolvimento. O jogo tinha um incrível nível de velocidade, e aquilo foi uma grande revelação para mim. Tivemos uma ideia de incluir fases com um cavalo correndo e cenas de surf em The Super Shinobi II para que os jogadores pudessem experimentar essa ação em alta velocidade – o mesmo efeito que uma perseguição de carro tem em um filme de ação. Estávamos cientes, no entanto, que isso levaria um grande esforço para se desenvolver. No final, eu acho que o conselho que recebemos da Treasure nos deu o empurrão que precisávamos para implementar essas sequências.

É popularmente conhecido que o The Super Shinobi II sofreu mudanças drásticas durante o seu desenvolvimento. Quais foram as principais modificações?

Como eu mencionei, eu entrei para o projeto a fim de aliviar algumas dos problemas de desenvolvimento. Tanto a equipe e eu sentimos que a ROM protótipo não correspondia à qualidade do resto da série.

Então, nós recriamos quase todas as fases, mesmo com o jogo já em fase final de desenvolvimento no momento. A maior mudança que fizemos foi com as habilidades físicas do personagem principal. Mesmo que houvesse uma variedade de movimentos disponíveis – corrida, uma voadora e até mesmo a capacidade de pular em paredes – os designs dos cenários consistiam principalmente de espaços fechados que não faziam o melhor uso dessas ações. Mesmo eu me senti confinado quando joguei. Então eu ampliei os cenários para mais de duas vezes do seu tamanho original, permitindo que o jogador tivesse muito mais espaço para correr e usar a voadora. No final, isso somou maior velocidade e fluidez ao jogo.

O jogo contou com um conjunto de inimigos extremos, incluindo mutantes e monstros como Godzilla-robô. Como você elaborou essas criaturas?

A equipe queria envolver certos aspectos de The Super Shinobi, e nós pensamos que poderíamos fazer lutas muito mais absurdas criando enormes chefões, como robôs e extraterrestres gigantes. Outro objetivo nosso era o de destacar o poder da organização do mal Zeed, incluindo alguns exemplos impressionantes de sua infra-estrutura, como uma fortaleza voadora.

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Qual é o elemento mais importante ao dirigir um jogo hack and slash ou beat ‘em up?

Eu coloquei grande ênfase em tornar o The Super Shinobi II um jogo legal para jogar, então eu passei muito tempo ajustando o tamanho dos níveis, jogando-os repetidas vezes, mudando o arranjo dos inimigos e itens. No design do jogo, até mesmo uma pequena alteração na altura de um ponto de apoio, por exemplo, ou a inclusão de um inimigo em particular, pode produzir diferentes níveis de calma ou tensão no jogador. Além disso, na concepção das fases, eu me tornei obcecado com a colocação de power-ups. Escondia em lugares onde você normalmente não pensaria em ir. Por favor, tentem encontrá-los todos!

A equipe chegou a recorrer de quaisquer influências particulares, enquanto produziam o jogo?

Havia muitas pessoas na equipe que gostavam do universo cyberpunk, então o design dos edifícios e mecanismos tiveram influências de Blade Runner e Appleseed. Alguns dos cenários tiveram referências de filmes do James Bond e do mangá Cobra.

Houve desafios no desenvolvimento para o Mega Drive?

O The Super Shinobi II foi uma ROM de 8 megabit e foi muito difícil de trabalhar dentro desta capacidade fixa. Tentei várias técnicas de compressão caseiras e, eventualmente, consegui obter o tamanho necessário. As características do Mega Drive eram relativamente simples, mas era um excelente console que nos permitia usar um monte de truques de programação. O logotipo animado da Sega que aparece no início no jogo, por exemplo, foi criado por um dos nossos programadores como um teste para contornar a incapacidade do hardware para dimensionar sprites.

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O que The Super Shinobi II te ensinou sobre desenvolvimento, e quais foram suas melhores lembranças de fazê-lo?

Ele não era tanto sobre a aprendizagem de habilidades técnicas. Era mais sobre valorizar a importância do trabalho em equipe no desenvolvimento de jogos. Apesar de programadores, artistas e técnicos de som desempenharem diferentes papeis, foi fundamental criar um ambiente de trabalho em que todos pudessem compartilhar suas opiniões, independentemente da hierarquia. O The Super Shinobi II é uma obra de trabalho que eu e os outros membros da equipe dedicaram todas as nossas energias, e para nós ele é um tesouro precioso.

Em um nível pessoal, quais são os seus jogos de Mega Drive favoritos?

Entre muitos bons jogos, o primeiro que vem à mente é ToeJam & Earl. Eu estava totalmente nocauteado por ele desde a primeira vez que eu joguei. Era tão funky e cool [risos]. Eu tenho um sentimento real do espírito, personalidade e paixão dos desenvolvedores pelo jogo pela sua enorme qualidade.

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