P: Antes de mais nada, por favor se apresente para o pessoal.
R: Meu nome é Heriberto, trabalho na Tectoy há 25 anos. Comecei como engenheiro, passei para coordenação e agora estou como gerente de engenharia.

P: Qual é o seu papel no novo Mega Drive?
R: O desenvolvimento do hardware e do software.

P: Este Mega Drive rodará os jogos da mesma forma que o console original ou será algo próximo? Uns noventa ou noventa-cinco porcento?
R: É algo irrealizável hoje em dia [rodar igual], no entanto estamos buscando o máximo em compatibilidade de hardware e software.

Anúncio do primeiro Mega Drive da Tectoy
Anúncio do primeiro Mega Drive da Tectoy

P: Você poderia explicar mais sobre a ausência do HDMI no novo Mega Drive?
R: Vivemos algo parecido no passado, quando todos os televisores só tinham entrada de RF e a Sega lançou o Saturno, que só tinha saída de áudio e vídeo. Tivemos que vender uma caixinha, um modulador RF, porque as pessoas pediram. Naquela época a gente tinha um sinal melhor que era o vídeo composto e tivemos que baixar a qualidade para RF. Agora estamos enfrentando uma situação parecida. Nós temos o vídeo composto, que não tem um sinal com qualidade tão boa quanto HDMI. Até agora, estamos vendendo de 20 mil a 50 mil Master Systems por ano sem HDMI e estes Masters estão convivendo com TVs de LCD há muito tempo e ainda não tivemos nenhuma crise de “não conexão”.

P: Fale um pouco sobre os jogos que virão inclusos com o novo Mega Drive e a entrada para cartão.
R: Trata-se de nossos jogos licenciados. Sobre o cartão, primeiramente queremos é que as pessoas usem cartuchos.

P: A Tectoy planeja relançar cartucho de algum jogo para utilizar neste Mega?
R: Estamos batalhando para isso, não tecnicamente, mas no que diz respeito às licenças.

P: A Sega tem de autorizar, assim como quem criou os jogos?
R: A Sega é uma grande parceira. O problema é achar o dono do jogo, que é algo tão antigo.

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Cartuchos lançados nos anos 80-90 pela Tectoy

P: Há jogos que a empresa que fez nem existe mais, correto?
R: Não existe. De repente tem uma pessoa responsável para cuidar deste assunto, que a papelada ficou na gaveta de alguém, foi para o lixo, ninguém sabe. Essa que é a grande luta das licenças.

P: Qual a maior dificuldade que você está encontrando na criação do novo Mega?
R: A equipe reduzida.

P: Mudando um pouco de assunto, existem dois jogos nos quais você esteve envolvido que me chamaram muito a atenção. O primeiro foi o Street Fighter II de Master. Como foi fazer este jogo?
R: Eu era o coordenador de software na época. O projetista deste jogo foi o Maurício Guerta. Eu falo sem medo de errar, trabalhando com o pessoal de hardware e software, estou para ver um “coder” mais brilhante do que ele.

Na verdade, como foi que nasceu isso, foi até curioso. Há muito tempo a gente estava ensaiando ter esse cartucho pro Master e a Sega não queria fazer, dizendo que era impossível, mas eu acredito é que eles não tinham cronograma para fazer. A Tectoy insistiu e aí resolvemos pegar as artes do jogo de Mega, abrindo o binário, arrancando com emuladores, reduzir pro tamanho de Master e movimentar elas, gerando um protótipo de movimento. Eles (a Sega) continuaram com a mesma posição. Aí pensamos “Quer saber? Já fizemos todo o trabalho da arte, vamos fazer o jogo.” E aí tocamos o barco.

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Street Fighter II lançado para Master System pela Tectoy

P: Quanto tempo levou para criar o Street Fighter II de Master?
R: Esse foi até bem rápido. Diria que foram 4 a 5 meses, sem contar o trabalho de redução, que levou de 1 a 2 meses.

P: O segundo jogo é o Duke Nukem do Mega Drive. Como foi o processo de desenvolvimento?
R: Foi assustador. Aliás, existe uma informação que corre por aí que ele é baseado na engine do labirinto do Phantasy Star. Isto foi uma confusão tremenda que se fez aqui dentro. Não foi isso. Esse projeto também foi encabeçado pelo Maurício. Ele estudou técnicas de renderização 3D numa época que ninguém tinha internet, durante muito tempo. Quando surgiu a oportunidade, ele se sentiu preparado para fazer a engine do jogo. Quando explicamos para o pessoal de marketing e comercial, nosso plano A era fazer uma engine baseada numa técnica chamada Raycast. Isso dependia de um processamento muito poderoso e teríamos de usar muito código. Se isso não desse certo, no pior dos casos, como plano B, a gente faria tipo um labirinto do Phantasy Star, só que nele você só olha zero graus, noventa graus, você só tem quatro graus. Então o Duke Nukem foi baseado na técnica Raycast e tivemos que enxugar muito código ali, viu.

P: E quanto tempo levou para desenvolver o jogo?
R: 14 meses.

Ayrton Senna Super Monaco GP II lançado pela Tectoy
Ayrton Senna’s Super Monaco GP II lançado pela Tectoy

P: Há alguma coisa ou curiosidade a respeito dos seus 25 anos de empresa que você gostaria de compartilhar? Algo que ninguém saiba mas que você pode falar?
R: Acho que é mais um desabafo por exemplo mais da parte da minha profissão como desenvolvedor de hardware e software. A Tectoy, pelo que vejo por aí, é uma das poucas empresas que sempre apoiou a gente. Hoje em dia, existe uma tendência de terceirizar tudo. Qualquer coisa tem de ser desenvolvida em outros países, trazida da China, provocando uma carência muito forte de pessoal técnico no nosso país. Eu vi frases de gente que disse que o Brasil hoje é um país tecnológico. Não é. Somos usuários. Sabemos arrastar o dedo em cima de uma tela de celular, mas não sabemos fazer um celular.