Assim como a própria Tectoy e as saudosas locadoras (feriadão está aí, já garantiu aquele lançamento?!), as revistas de videogames foram parte importante da cultura gamer no Brasil lá nos anos 80/90, que infelizmente foram perdendo a força com a chegada da internet e os efeitos da globalização no início do século XXI.

Antes da internet, o único meio dos jogadores acompanharem as novidades do mundo dos games, ou de obter aquela super dica ou de acompanhar o detonado de um jogo muito difícil, era folheando essas revistas especializadas – e não faltavam opções!

Uma das primeiras e mais conhecida a surgir no mercado foi a Ação Games, que deu as caras pela primeira vez em 1990. No ano seguinte chegava ao mercado a revista que marcou os fãs da Sega, a Supergamesua primeira edição tinha o Sonic na capa!

Supergame #1 (1991)

Essa revista apresentava alguns diferenciais marcantes em relação às outras publicações, tanto no modo como os textos eram escritos quanto no modo como eram apresentados, mas principalmente pela presença do “O CHEFE“, um personagem cuja identidade era secreta (mas anos depois descobriu-se que era baseado no editor-chefe da época, o jornalista Matthew Shirts).

Uma das coisas mais legais ao iniciar a leitura da Supergame era justamente ler os divertidos editoriais do CHEFE, que tinha uma personalidade linha dura, sempre torturando os jornalistas em busca de mais matérias enquanto curtia uma boa vida, os games e mulheres.

o Chefe na vida real (Matthew Shirts) e o personagem na revista

Com o sucesso da revista, a editora Nova Cultural (a mesma da Supergame) resolveu apostar na “concorrência” e assim nasceu a Game Power, que por sua vez era dedicada aos sistemas da Nintendo. A GP não tinha um “CHEFE”, mas criou quatro personagens fictícios (outros surgiriam mais tarde) que eram os principais jornalistas (suas identidades também eram secretas): Baby Betinho, especialista em jogos de luta; Marcelo Kamikaze, autoridade em RPGs; Lord Mathias, perito em ação e esporte; e Marjorie Bros, expert em aventura e simuladores, considerada pelos leitores a “musa” da revista.

E em 1994 o inevitável aconteceu: as duas revistas se fundiram e nasceu então a SuperGamePower, que trazia todos os personagens fictícios juntos e que se tornou uma das mais populares publicações de games do Brasil!

SuperGamePower #1 (1994)

Mas toda essa história e nostalgia serviu apenas como forma de introdução para a Revista Jogo Véio, uma publicação digital que além de se focar nos videogames clássicos como NES, Master System, Mega Drive e Super Nintendo, tem como proposta essa pegada editorial das antigas e saudosas revistas impressas, tanto no texto como na diagramação – ela até possui um editor-personagem conhecido como “O VÉIO“.

Conversamos com Eidy Tasaka, o responsável pelo projeto que atualmente está em sua quarta edição – com destaque para os jogos do Sonic – e que ganha cada vez mais popularidade, não apenas pela nostalgia pelos jogos clássicos, como também por reviver os sentimentos das antigas e saudosas revistas de videogames! Confira:

ENTREVISTA

Olá Eidy, faça sua apresentação e nos fale como surgiu a Revista Jogo Véio e qual é a sua proposta?

Eu sou um véio carioca radicado em São Paulo desde 2015. Apaixonado por videogames, decidi em algum momento no começo do ano passado criar um “blogzinho” para falar de jogos antigos. Rapidamente, as coisas foram crescendo até que nós decidimos criar uma revista digital, bem nos moldes da Ação Games, Supergame e afins. Hoje, a Revista Jogo Véio tenta ser uma ponte para a infância e para um período muito marcante dos videogames, no Brasil e fora dele.

Quem faz parte da equipe da revista? Todo mundo é “véio” mesmo, da época das antigas revistas impressas?

O mais jovenzinho usa bengala e dentadura! A equipe da Revista Jogo Véio é composta por nove pessoas que se dividem entre a manutenção do site, as pautas das revistas e o nosso canal no YouTube, que ainda está engatinhando, mas vai dar uma encorpada muito em breve. Todos são “das antigas”, leitores e apaixonados por revistas de videogame. Alguns, inclusive, já possuem experiência como redatores de revistas impressas. Eis a escalação: Na redação temos o Eduardo Paiva, Ítalo Chianca, Fabio Zonatto, Lucas Rodrigues, Vinicius Eleno, Daniel Nunes e Mario Camara. Já o comando do canal fica a cargo da Sora Renard!

Assim como na saudosa revista Supergame, que tinha como personagem/editor “O Chefe”, a sua revista tem “O Véio”. Como ele surgiu?

A ideia de criar o Véio surgiu exatamente a partir da revista Supergame. Esse conceito de ter um personagem assinando os textos sempre me fascinou bastante. Era uma boa oportunidade para trabalhar textos mais bem humorados, além de construir um vínculo mais íntimo com os leitores. Quem segue o Jogo Véio nas redes sociais, com certeza já está acostumado a ser chamado de “Véio” e “Véia”, fora alguns outros trejeitos que fui incorporando ao longo do tempo na forma de escrever do personagem. E a galera já se acostumou! As perguntas são sempre endereçadas ao Véio, e não necessariamente à pessoa que está atrás do monitor.

Quais são as etapas para produzir uma revista como a Jogo Véio? Como é feita a seleção das matérias a serem publicadas?

Nós realizamos algumas reuniões, sempre com alguma antecedência, para ir levantando temas que possam ser relevantes na época da publicação da revista, além de ir negociando a participação de redatores convidados de outros canais. No mesmo momento em que uma edição é disponibilizada para os leitores, nós já temos um esqueleto da edição seguinte. Após o prazo para a elaboração dos textos, temos uma primeira revisão e de lá, direto para a diagramação. Conforme as páginas são fechadas, elas vão para a avaliação e revisão da equipe, até fechar a revista. Sobre as pautas, em alguns casos nós nos guiamos segundo aquilo que está mais em evidência no momento. Para a edição 4, por exemplo, nós fomos na rabeira do lançamento de Sonic Mania. Isso não é uma regra, mas ajuda bastante na hora de divulgar a revista e conquistar novos leitores.

Você acha que há espaço para uma revista digital como a Jogo Véio contra a praticidade que a internet oferece?

Com certeza! Tem quem prefira o conteúdo disposto de uma maneira mais objetiva, com texto preto sobre o fundo branco e ponto final. Por outro lado, existe um público que busca uma experiência imersiva e romanceada. E é nessa fatia da internet que nós estamos mirando. Quando esse cara nos lê falando sobre Sonic, ele não está apenas absorvendo o conteúdo do texto, mas revisitando suas próprias lembranças da infância e das revistas de videogame da época.

Falando em internet, graças a ela tudo ficou mais rápido e acessível, porém as publicações antigas tinham um certo charme e personalidade especiais. Você acha que os grandes sites de games conseguem traduzir esse mesmo sentimento para a nova geração?

Essa velocidade que a internet oferece é uma faca de dois gumes. Por um lado, sabemos dos lançamentos de jogos no Japão e Estados Unidos em um piscar de olhos. Entretanto, acaba parecendo uma grande briga para ver quem dá a notícia primeiro, sem imprimir nenhum traço marcante que possa diferenciar um veículo do outro. Sinto falta de conteúdo autoral, que você consiga reconhecer de longe antes mesmo de ver o nome do autor. Talvez seja essa a maior diferença entre um período e o outro.

Quais revistas antigas eram as suas favoritas e por quê?

Perguntinha maléfica, essa! Olha, eu diria que temos um empate técnico entre a SuperGamePower e a Gamers. A SGP era mais completona e recheada, além de ter os personagens redatores que eu sempre curti. Já a Gamers era uma revista mais empenhada em ser o seu guia de cabeceira, sabe? Se aprofundava em todos os assuntos, usando uma fonte minúscula e toda apertadinha para fazer os textos caberem nas páginas. Dava pra ver de longe que a revista era feita por uma galera muito tarada por videogames!

Como vocês se mantêm e como os fãs podem ajudar?

O Jogo Véio não tem nenhuma fonte de renda e todos da equipe atuam de maneira colaborativa. As nossas despesas, hoje, se resumem aos custos de manutenção do site e de divulgação, que não são muitos. Entretanto, isso acaba limitando a quantidade de material que nós conseguimos produzir. Um exemplo disso é a própria revista, que hoje é lançada de maneira bimestral. Além disso, temos projetos para outras publicações que acabam esbarrando nessa questão.

Criamos uma proposta de financiamento coletivo para viabilizar mais um monte de coisas bacanas, e essa é a melhor forma de a veiarada colaborar com o projeto. Quem quiser ajudar, o endereço é: https://apoia.se/jogoveio. Nossa primeira meta é um fanzine digital, mais ou menos como eram os jornaizinhos da Sega!

O que você achou do relançamento do Mega Drive e do jogo Turma da Mônica na Terra dos Monstros?

Uma verdadeira viagem no tempo e que atingiu todo mundo em cheio. Mesmo os mais puritanos! Quem é retrogamer assumido e ainda tem o console antigo em casa, mesmo sem comprar o novo Mega teve a oportunidade de ver o console em evidência mais uma vez. E quem não tinha ou não viveu esse período glorioso, certamente se deliciou com a experiência de abrir a caixa e sentir aquele cheirinho viciante de um videogame zerado!

Você possui alguma história especial com a Tectoy e seus consoles/jogos que gostaria de compartilhar?

Tem um causo divertido que aconteceu comigo na época do lançamento do Mortal Kombat 3. Eu havia pedido o jogo de aniversário, e no dia recebi um pacote super bem embrulhado, mas naquele formatinho retangular característico. Quando rasguei o papel, para o meu espanto, era um cartucho de World Cup 94′.

Disfarcei a tristeza com um sorriso amarelo e quando questionado se havia gostado do presente, respondi que sim, mas com aquela cara de quem chupou um limão. Aí me entregaram o verdadeiro presente: Mortal Kombat 3! No fim das contas o saldo foi super positivo e eu ganhei dois jogos no mesmo dia!

Por fim, há planos para uma versão impressa da Jogo Véio?

Há uma vontade muito forte, e nós estamos nos movimentando bastante pra que isso aconteça. O público retrogamer valoriza muito a experiência de ter uma mídia física, e isso certamente nos ajudaria a tornar a revista mais conhecida. Nesse momento, estamos abertos a parcerias e propostas de patrocínio que nos ajudem a atingir essa meta. Mas isso não invalida a ideia de termos sempre uma publicação digital para os fãs!